Consumir café prejudica a qualidade do sono? E o ovo, é mocinho ou vilão na nossa alimentação? Quais são os impactos da temperatura, da densidade demográfica e da percepção de violência sobre a nossa saúde física e mental? Embora tais perguntas possam ser do interesse de jornalistas e de leitores, elas só ganham sentido científico se houver clareza sobre a definição operacional da variável de interesse.
Neste post, vamos entender o significado de definição operacional, bem como sua importância no planejamento e na comunicação de resultados de pesquisa. Por meio de exemplos, discutiremos o que o termo significa, como é utilizado e quais são suas vantagens e limitações.
O que é definição conceitual?
Pesquisas científicas frequentemente lidam com conceitos não observáveis, também chamados de construtos — entidades teóricas usadas para representar fenômenos empíricos.
Por exemplo, áreas como administração (e.g., clima organizacional), saúde pública (e.g., qualidade de vida), sociologia (e.g., capital social), biologia (e.g., fitness) e psicologia (e.g., aprendizagem) usam construtos para descrever e explicar processos complexos.
De modo geral, construtos são características ou atributos inferidos a partir de suas manifestações observáveis. Assim, quando uma criança diz “au-au” apenas para cachorros, esse comportamento se torna uma evidência empírica de que ocorreu aprendizagem — mesmo que o processo em si não possa ser diretamente observado.
Nesse contexto, uma definição conceitual descreve o significado teórico de um construto. Por exemplo: aprendizagem é uma mudança relativamente permanente no comportamento ou no potencial comportamental, resultante da experiência e não atribuível a estados corporais (Figura 1).

Essa definição ressalta quatro aspectos. Primeiramente, a aprendizagem envolve mudança — se Alice não falava inglês e agora fala, observamos uma mudança em seu comportamento.
Segundo, a mudança pode ser potencial, isto é, nem sempre se expressa de imediato. Mesmo que Alice não fale inglês em casa, ela ainda possui a habilidade e pode demonstrá-la em outro contexto.
Terceiro, a mudança deve decorrer da experiência, e não da maturação biológica. Por exemplo, o início da puberdade não é aprendizagem, pois resulta de processos fisiológicos naturais.
Por fim, a definição exclui alterações causadas por estados corporais, como privação de sono, uso de drogas ou lesões cerebrais.
Em resumo, a definição conceitual estabelece o que estudar, mas ainda não determina como observar ou medir o construto.

O que é definição operacional?
A definição operacional especifica os procedimentos usados para observar e mensurar uma variável. Ao defini-la, o pesquisador explica como capturar empiricamente o construto — ou seja, como identificá-lo, medi-lo ou avaliá-lo.
Por exemplo, retomando construto aprendizagem, podemos defini-lo operacionalmente como o número de lances livres convertidos em cestos, de um total de 20 tentativas realizadas atrás da linha de lance livre, a 5,8 metros da linha de fundo. Quanto maior o número de acertos, maior o nível de aprendizagem (Figura 2).

Essa definição operacional descreve o procedimento de mensuração com precisão. Cada participante realiza 20 arremessos da mesma posição, e registra-se o número de acertos. Qualquer pesquisador pode reproduzir o mesmo método, garantindo replicabilidade.
Além disso, a definição permite comparações entre indivíduos. Se Fred acerta 10 de 20 e Gabriel acerta 15 de 20, podemos inferir que, segundo essa definição operacional, Gabriel apresentou maior aprendizagem.
Qual é a relação entre definição conceitual e operacional?
As definições conceitual e operacional são complementares. Enquanto a primeira explica o que o construto significa em termos teóricos (o que medir), a segunda descreve suas manifestações observáveis (como medir).
Em outras palavras, a definição conceitual fornece o contexto teórico, e a definição operacional transforma esse contexto em indicadores mensuráveis. Essa relação assegura que as medições representem de fato o fenômeno de interesse.
Por exemplo, considere o construto depressão. Conceitualmente, ele envolve componentes fisiológicos (alterações de sono e apetite), comportamentais (choro, retraimento social), cognitivos (crenças de desvalor), volicionais (falta de motivação) e emocionais (tristeza, desesperança).
Com base nesses componentes, pesquisadores podem construir instrumento de autorrelato que avaliem cada faceta — sono, humor, autopercepção etc. Assim, o instrumento cobre o construto em amplitude (vários domínios, como o comportamental) e em escopo (diferentes manifestações, como o comportamento de choro e de retraimento social).

Portanto, a definição conceitual guia o desenvolvimento das medidas, e a definição operacional traduz a teoria em procedimentos observáveis. Juntas, garantem coerência entre o que se pretende investigar e o que efetivamente se observa.
Outros exemplos de definições operacionais
Em seguida, fornecemos exemplos adicionais para compreendermos melhor as definições operacionais:
- Motivação acadêmica:
- Número médio de tarefas entregues dentro do prazo durante o semestre letivo.
- Escore em uma escala de autorrelato que avalia esforço e interesse pelos estudos.
- Estresse:
- Nível de cortisol medido em amostras de saliva após tarefa de fala pública.
- Pontuação total em um inventário psicológico que mede tensão e irritabilidade.
- Empatia:
- Frequência e intensidade de comportamentos de ajuda, como tempo gasto auxiliando alguém em necessidade.
- Escore em uma escala de empatia interpessoal, que mede compreensão emocional e tomada de perspectiva.
- Qualidade do sono (Figura 4):
- Latência do sono (tempo entre deitar e dormir).
- Eficiência do sono (relação entre tempo dormindo e tempo total na cama).

Esses exemplos mostram que não há uma única definição operacional correta. Pesquisadores devem escolher aquela que melhor se ajusta aos objetivos do estudo.
Quais são as características de uma boa definição operacional?
Uma boa definição operacional deve atender a alguns critérios fundamentais para garantir clareza e rigor científico. Primeiramente, ela precisa ser específica, isto é, o pesquisador deve descrever com precisão quais procedimentos, instrumentos ou indicadores serão utilizados.
Além disso, a definição operacional deve ser replicável. Em outras palavras, outros cientistas precisam ser capazes de reproduzir exatamente o mesmo procedimento. Uma definição que não pode ser replicada compromete a confiabilidade dos resultados.
Ela também precisa ser comunicável (Figura 5): evitar ambiguidades e permitir que pesquisadores “falem a mesma língua” (Cozby & Bates, 2018). Mesmo que alguém discorde da operacionalização de “inteligência”, essa pessoa deve ser capaz de compreender exatamente como o construto foi definido operacionalmente.

Por fim, é importante que a definição operacional seja válida. Em outras palavras, as operações usadas para produzir manifestações observáveis do construto realmente devem representar adequadamente esse construto.
Por fim, a definição deve ser válida — isto é, as operações realmente precisam representar o construto que se pretende medir. Por exemplo, medir aprendizagem apenas pelo número de acertos de arremessos pode ser insuficiente, pois falta o componente essencial de mudança ao longo do tempo.
No entanto, se essa definição operacional estiver inserida em um contexto experimental, no qual os participantes sejam comparados em dois ou mais momentos e submetidos a diferentes intervenções entre as tarefas, o desempenho nos arremessos pode constituir uma definição perfeitamente adequada ao problema de pesquisa em questão.
Qual é a relevância da definição operacional em uma pesquisa?
A definição operacional é fundamental para o planejamento e a comunicação científica. No que se refere ao planejamento, ela expressa o construto por meio de tarefas experimentais e dos instrumentos de medida.
Em outras palavras, ao definir operacionalmente um construto, o pesquisador está especificando quais comportamentos, respostas ou indicadores serão observados e como essas manifestações serão registradas. Essa clareza permite que a redação dos itens de um questionário, ou o desenho de uma tarefa experimental, reflita com precisão o construto que se pretende avaliar.
Além disso, uma boa definição operacional aumenta a clareza e reduz ambiguidades. Ou seja, ela permite que conceitos abstratos sejam expressos em termos concretos, tornando possível sua investigação empírica (Cozby & Bates, 2018; Kazdin, 2017).
Além disso, a definição operacional facilita a replicação de experimentos, um dos pilares da ciência (Goodwin & Goodwin, 2013). Diferentes pesquisadores podem adotar os mesmos critérios e verificar se os resultados se repetem, o que fortalece a confiabilidade das conclusões.
Portanto, sem definições operacionais claras, a pesquisa científica se tornaria vaga e pouco comunicável.
Quais são as limitações das definições operacionais?
Apesar de suas vantagens, as definições operacionais têm limitações. Uma delas é a redução do conceito. Por exemplo, definir inteligência apenas como o resultado de um teste de raciocínio pode ignorar aspectos como pensamento divergente.
Outra limitação é a falta de padronização entre operacionalizações distintas: diferentes estudos podem usar definições distintas para o mesmo construto, dificultando comparações e até gerando conclusões opostas. O caso do ovo “mocinho ou vilão” é um exemplo disso — diferentes operacionalizações de “saúde” levam a conclusões divergentes sobre o papel que o ovo desempenha em nossas vidas.
Assim, embora indispensáveis, as definições operacionais devem ser avaliadas criticamente quanto à validade e abrangência.
Definição operacional e operações convergentes
Uma forma de contornar limitações é usar operações convergentes. Esse conceito sugere que a confiança em um resultado aumenta quando diferentes definições operacionais, aplicadas em contextos diversos, apontam para a mesma conclusão.
Por exemplo, a distinção entre os construtos memória semântica e memória episódica ganha força quando evidências psicológicas, clínicas e neurocientíficas convergem para apoiá-la. Caso as evidências fossem inconclusivas ou contraditórias, não seria justificável termos dois construtos, ao invés de apenas um, para descrever a memória declarativa.
Da mesma forma, se uma psicoterapia visa reduzir a ansiedade e múltiplas medidas (autorrelato, registros fisiológicos e observação estruturada) indicam redução dos sintomas, a confiança na eficácia da intervenção aumenta.
Entretanto, diferentes operacionalizações também podem introduzir variância irrelevante ao construto de interesse. Por exemplo, um teste de habilidades matemáticas apresentado apenas em formato textual pode penalizar estudantes com dificuldades de leitura, sem refletir suas verdadeiras habilidades numéricas (Figura 6).

Uma solução é usar múltiplas definições operacionais de habilidades matemáticas (i.e., múltiplos formatos e estilos de testes) e integrar os escores em uma variável latente, por meio de modelagem por equações estruturais. Assim, múltiplas operacionalizações complementares ampliam a validade dos achados.
Conclusão
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Referências
Cozby, P. C., & Bates, S. C. (2018). Methods in behavioral research (13th ed.). McGraw-Hill Education.
Goodwin, C. J., & Goodwin, K. A. (2013). Research in psychology: Methods and design (7th ed.). Wiley.
Kantowitz, B. H., Roediger, H. L., III, & Elmes, D. G. (2009). Experimental psychology (9th ed.). Wadsworth.
Kazdin, A. E. (2016). Research design in clinical psychology (5th ed.). Pearson.
Shaughnessy, J. J., Zechmeister, E. B., & Zechmeister, J. S. (2012). Research methods in psychology (9th ed.). McGraw-Hill.
Como citar este post
Lima, M. (2025, 14 de outubro). O que é uma definição operacional? Blog Psicometria Online. https://blog.psicometriaonline.com.br/o-que-e-uma-definicao-operacional
