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O que é e para que serve a média aparada?

Marcos Lima

out 6, 2025

A média aparada é uma medida de tendência central robusta a valores extremos e a distribuições com caudas pesadas. Neste post, você aprenderá, em linhas gerais, como funciona o cálculo da média aparada, quais são as duas principais regras para aparar dados e quais são suas vantagens na análise estatística e na inferência robusta.

O que é uma média aparada?

A média aparada (trimmed mean) — ou média truncada (truncated mean) — é uma forma ajustada de média que reduz o impacto de valores atípicos. Em síntese, ao invés de incluir todas as observações, o pesquisador descarta uma parte dos menores e maiores valores da amostra antes de calcular a média aparada.

Implicitamente, esse conceito aparece em competições esportivas. Nos saltos ornamentais e na ginástica artística, as notas mais altas e mais baixas dos jurados são eliminadas para gerar uma pontuação mais justa.

Por exemplo, imagine uma atleta com as notas 7,2, 9,2, 8,8, 9,6 e 9,1. A média aritmética é 8,78, mas, ao removermos a menor (7,2) e a maior (9,6) nota, obtemos uma média aparada de 9,03 — uma estimativa mais equilibrada do desempenho real.

Em resumo, a média aparada ocupa uma posição intermediária entre a média aritmética e a mediana. À medida que removemos uma fração maior dos valores nas extremidades, o resultado se aproxima da mediana — que, por sinal, representa o caso limite da aparagem.

De modo semelhante, a média interquartílica é uma variação da média aparada, pois considera apenas os valores entre o primeiro e o terceiro quartis. Nesse caso, cerca de 25% das observações em cada ponta são excluídas, com a média aparada representando os 50% dos valores centrais.

Portanto, ao ajustar o percentual aparado, o pesquisador controla o equilíbrio entre sensibilidade e robustez, tornando a técnica valiosa em situações com ruído ou alta variabilidade.

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Principais regras para calcular a média aparada

Existem duas maneiras principais para calcular a média aparada, a saber, a regra baseada em porcentagem e a regra baseada desvio-padrão. Ambas visam reduzir o efeito de valores extremos, mas utilizam critérios diferentes.

Em seguida, veremos cada uma dessas regras.

Regra baseada em porcentagem

Na regra baseada em porcentagem, o pesquisador define uma porcentagem fixa de exclusão de observações. Por exemplo, ao aparar 10%, removem-se 10% dos menores e 10% dos maiores valores, calculando a média aritmética com base nos 80% casos remanescentes.

Para ilustrar, considere o conjunto de dados da Figura 1, apresentados em ordem crescente.

exemplo de conjunto de dados e média aritmética simples.
Figura 1. Exemplo de conjunto de dados com 10 observações.

A média aritmética de 15,7 está acima de oito dos 10 escores. Isso ocorre porque os dois últimos escores são substancialmente diferentes dos demais. Consequentemente, a média é influenciada por essas observações.

Uma solução é excluirmos um valor de cada extremidade e recalcularmos a média com base nos demais valores, o que resulta em uma média aparada de 10% (Figura 2).

exemplo de média aparada de 10%.
Figura 2. Média aparada de 10%.

A média caiu de 15,7 para 7. Ou seja, o impacto do valor extremo que excluímos foi reduzido. No entanto, cinco dos oito escores (62,5%) ainda estão abaixo da média. Isso sugere que o novo escore máximo (22) ainda impacta a média. Desse modo, podemos aparar mais um escore em cada ponta e computar a média aparada de 20% (Figura 3).

exemplo de média aparada de 20%.
Figura 3. Média aparada de 20%.

Agora, a média caiu de 7 para 5,33, indicando um valor mais representativo dos dados. Se seguíssemos neste processo, poderíamos chegar a uma média aparada de 40%, que, em nosso exemplo, seria o caso mais extremo de aparagem, a saber, a mediana (Figura 4).

exemplo de média aparada de 40%.
Figura 4. Média aparada de 40%.

Essa abordagem é intuitiva e muito usada em relatórios estatísticos, pois mantém o controle direto sobre o percentual de dados excluídos em cada cauda da distribuição.

Regra baseada em desvio-padrão

A segunda forma de calcular a média aparada usa o desvio-padrão como referência. Nesse caso, excluem-se valores fora de um número pré-definido de desvios-padrões. Essa técnica é útil quando se deseja padronizar a aparagem entre amostras.

Por exemplo, essa regra é bastante usada em experimentos com tempos de reação (Ratcliff, 1993). Uma vez que tempos de reação são naturalmente truncados em zero e tendem a apresentar assimetria positiva, algumas tentativas com respostas muito lentas (e.g., por lapsos atencionais) distorcem a média.

Considere os dados de tempos de reação de um participante hipotético (Figura 5), que seguem uma distribuição exponencial.

dados de tempos de reação com simetria positiva.
Figura 5. Dados de tempos de reação com distribuição com assimetria positiva.

Esse participante tem tempo médio de 0,97 s (DP = 0,97). A regra de ±2,5 desvios-padrões indica, portanto, que devemos excluir valores abaixo de 0,97 – 2,5 × 0,97 = –1,46 s, e acima de 0,97 + 2,5 × 0,97 = 3,40 s. No entanto, como tempos de reação nunca são negativos, excluíremos apenas as tentativas com tempos de reação acima de 3,40 s.

O cálculo da média aparada, portanto, se baseará apenas nos tempos de reação abaixo de 3,40 s (Figura 6, região azul).

ilustração da média aparada baseada na regra do desvio-padrão
Figura 6. Dados de tempos de reação com aparagem usando a regra baseada em desvio-padrão.

Após a aparagem, a média cai de 0,97 s para 0,88 s (uma queda de 90 ms). Ademais, observe que o desvio-padrão também diminuiu — de 0,97 s para 0,79 s —, uma consequência direta de mantermos nos dados apenas valores mais homogêneos.

Essa regra é mais adaptável em amostras heterogêneas, pois leva em conta a variabilidade interna dos dados. Contudo, há uma limitação: os valores extremos afetam tanto a média quanto o desvio-padrão, que são as próprias estatísticas que usamos para definir o critério de aparagem — um ponto crítico destacado por Field (2017).

Quais são as vantagens de usar a média aparada?

A média aparada apresenta várias vantagens. Primeiramente, ela reduz a influência de outliers, tornando as análises mais estáveis e confiáveis. Além disso, ela mantém as principais propriedades estatísticas da média, facilitando comparações e interpretações entre estudos.

Para ilustrar, considere uma simulação com 20 observações de uma distribuição normal-padrão (M = 0, DP = 1). Calculamos a média aritmética e a média aparada de 20% — isto é, excluímos oito das 20 observações — e repetimos o procedimento 5 mil vezes. A Figura 7 apresenta as distribuições amostrais de ambas as médias.

distribuições amostrais da média aritmética e média aparada de 20% no caso de distribuição normal.
Figura 7. Distribuições amostrais de médias (distribuição normal).

A variabilidade de cada curva, representada pelo erro-padrão (EP), indica a precisão com que um estimador se aproxima da média populacional. Os resultados mostram EP = 0,23 para a média aritmética e EP = 0,24 para a média aparada — uma diferença mínima, mesmo com menos dados utilizados.

Outra vantagem é a robustez. Mesmo diante de erros de medição ou distribuições com caudas pesadas, a média aparada mantém bom desempenho.

Para demonstrar, considere uma distribuição normal contaminada (Wilcox & Keselman, 2003), composta por 90% de casos controle (M = 0, DP = 1) e 10% de casos clínicos (M = 0, DP = 10). Repetindo o mesmo procedimento de 5 mil amostragens, a Figura 8 revela que o EP da média aparada foi de 0,27, enquanto o da média aritmética atingiu 0,74. Assim, ao eliminarmos valores extremos, obtemos estimativas muito mais consistentes.

distribuições amostrais da média aritmética e média aparada de 20% no caso de distribuição com caudas pesadas.
Figura 7. Distribuições amostrais de médias (distribuição normal contaminada).

Por fim, a média aparada — e a aparagem, de forma mais ampla — estão subjacentes aos chamados métodos estatísticos robustos, que buscam manter o controle dos erros dos Tipos I e II mesmo quando violamos pressupostos estatísticos.

Em síntese, a média aparada melhora a precisão, a robustez e a confiabilidade das análises.

Trimming na inferência estatística

Na inferência estatística, o termo trimming (ou aparagem de dados) tem papel importante em métodos estatísticos robustos. Nesses casos, pesquisadores aplicam a média aparada dentro de testes e estimativas para reduzir o impacto de observações atípicas.

Por exemplo, o teste t de média aparada (trimmed mean t-test) é uma variação robusta do teste t tradicional (Yuen, 1974; Yuen & Dixon, 1973). Ele substitui as médias comuns pelas médias aparadas, aumentando assim a resistência do teste a violações de normalidade e presença de valores extremos.

Além disso, o trimming pode ser aplicado em regressões e intervalos de confiança, melhorando a estabilidade das estimativas. Dessa forma, pesquisadores obtêm resultados mais confiáveis, mesmo quando os pressupostos clássicos da estatística são apenas parcialmente atendidos.

Portanto, o uso de aparagem na inferência estatística amplia a aplicabilidade dos métodos, tornando-os mais realistas diante da variabilidade natural dos dados.

Conclusão

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Referências

Ratcliff, R. (1993). Methods for dealing with reaction time outliers. Psychological Bulletin, 114(3), 510–532. https://doi.org/10.1037/0033-2909.114.3.510

Sladekova, M., & Field, A. P. (2025). Robust statistical methods and the credibility movement of psychological science. PeerJ, 13, Article e20043. https://doi.org/10.7717/peerj.20043

Wilcox, R. R., & Kesselman, H. J. (2003). Modern robust data analysis methods: Measures of central tendency. Psychological Methods, 8(3), 254–274. https://doi.org/10.1037/1082-989X.8.3.254

Yuen K. K. (1974). The two-sample trimmed t for unequal population variances. Biometrika, 61(1), 165–170. https://doi.org/10.1093/biomet/61.1.165

Yuen, K. K., & Dixon, W. J. (1973). The approximate behaviour and performance o the two-sample trimmed t. Biometrika, 60(2), 369–374. https://doi.org/10.1093/biomet/60.2.369

Como citar este post

Lima, M. (2025, 6 de outubro). O que é e para que serve a média aparada? Blog Psicometria Online. https://blog.psicometriaonline.com.br/o-que-e-e-para-que-serve-a-media-aparada

Bruno Figueiredo Damásio

Sou Psicólogo, mestre e doutor em Psicologia. Venho me dedicando à Psicometria desde 2007.

Fui professor e chefe do Departamento de Psicometria da UFRJ durante os anos de 2013 a 2020. Fui editor-chefe da revista Trends in Psychology, da Sociedade Brasileira de Psicologia (SBP) e Editor-Associado da Spanish Journal of Psychology, na sub-seção Psicometria e Métodos Quantitativos.

Tenho mais de 50 artigos publicados e mais de 5000 citações, nas melhores revistas nacionais e internacionais.

Em 2020, saí da UFRJ para montar a minha formação, a Psicometria Online Academy.

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